quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

ANTINOMIA E ICONOCLASTIA NA VISÃO DA CASA DOS CORVOS SAGRADOS II



“...Em um desses encontros no portal de Hypnogogia, meu Mestre Francisco[1] me ensinou que nos tempos em que ele andava pelos sertões, existiam encontros secretos, onde a gente do povo, os mestiços e negros, se reuniam para saborear o caium...era uma festa regada a caium, a marca mestra (ou cachimbo recheado com fumo e  outras ervas), musicas (com maracás), comidas  e danças, nestas festa os Mestres (mortos) eram convocados e acostavam (nos vivos) para dançar, cantar, falar, curar, amaldiçoar, quebrar feitiços, abrir e fechar e caminhos e ensinar fumaças (Feitiçarias e Mandingas)... isso dependeria de que modo se abria a mesa ou se arriava no chão, se pela direita ou esquerda...Então eu  lhe disse: isso parecia  muito com os encontros que aconteciam na Europa e que eram chamados de Sabá das Feiticeiras...Nestes sabás, presidido pelo Diabo, o próprio ensinava-lhes suas Artes Proibidas...fui lhes explicando da melhor forma possível como deveria ter sido na idade média estes encontros heréticos de feiticeiras e bruxas... li parte do livro os Andarilhos do Bem para ele...falei dos Prados do Bode e dos Campos de Josafá...Quando acabei minha explicação, ele me disse: isso que vósmicê me disse é a mesma coisa do Adjunto de Jurema [2], os Campos de Josafá e os Prados do Bode, num sei onde é, mais o reino da Jurema chamado  Josafá eu conheço o caminho muito bem...E rimos muito...neste hora a Velha Destino - Deusa Mãe de Todos – retirou de sobre mim o véu de Lilith e retornei sobressaltado com o toque insistente do despertador do Celular eram 04h00 da manhã...” [3]

Podemos simploriamente dizer que a Bruxaria Tradicional se caracteriza por um conjunto de práticas cuja finalidade é mudar a realidade ao redor dos que dela se utilizam.

“...para o senso comum, ela era uma remediadora das mazelas sociais e resolutora de problemas pessoais e sentimentais, onde o poder público, cientifico ou religioso não tinham respostas ou negavam-se a realizar o que deveriam... procurada...para prover “benefícios ou malefícios...Deste modo, podemos dizer que...podia (e pode) garantir fertilidade, prosperidade, cura, sexualidade, amor, infertilidade, desgraça, doenças, impotência e separações amorosas, etc... [4]

Podemos ainda acrescentar que a Bruxaria Tradicional é um culto mistérico[5], de existência histórica, que sobreviveu como heresia medieval, porém espalhou seus tentáculos, antes, durante e depois da inquisição, nos diversos folclores e ethos, incluindo o nosso.

E para terminar, para os que a praticavam a Bruxaria como Ofício, ela era um meio de acesso aos poderes e uma forma de chegar ao Outro-Mundo, onde podiam comungar com os mortos e aprender suas Artes secretas[6].

Quando nos referimos as “Artes Renegadas” e redescobertas neste solo de pindorama[7], fica evidente que estávamos apontando para aquilo, que por analogia pode ser comparado com o que era chamado de “Artes do Diabo” durante a idade média, ou seja, as práticas de “Bruxaria ou Feitiçaria Medieval”.

O que se pode observar, além da forma expressa na prática na Arte do Diabo nesta Terra de Santa Cruz, são padrões de necessidades e finalidades para essas mesmas práticas na cultura, mesmo sendo ela algo marginal.

Em palavras simples, o que vemos em qualquer época e tempo, em qualquer povo ou nação, seja evoluído ou atrasado tecnologicamente, é a vontade da pessoa, que procura em segredo essas Artes, de sanar as mesmas necessidades e atingir determinadas finalidades, seja elas de Prosperidade, Saúde, Vingança, Amor, Benção, Maldição, Poder ou etc.

Mesmo que tentássemos destrinchar e diluir essas necessidades em pormenores, o que diferiria de um povo para outro ou de um local para outra, seria apenas sua expressão visível, ou seja, os meios, orações, entidades, técnicas, objetos e materiais empregados, e que neste caso seriam de senso comum a herança mágico-cultural de cada povo e do local, ou seja, no plano genérico, a finalidade e necessidade continuam sendo as mesmas.

Trocando em miúdos, o praticante dessa Arte do Diabo, usaria as práticas de feitiçaria local, seja herdada por iniciação ou por dom, seja ela elaborada como nos cultos africanos ou simples como no Adjunto de Jurema ou na pratica da benzedura, para sanar essas necessidades ou ajudar aquele que procuram a atingir suas finalidades seja ela de benção ou maldição.

Isso concorda com o que é ensinado pelo nosso iniciador na Tradição Ibérica, do qual aprendemos que a Feitiçaria ou Bruxaria, é um fenômeno topominico, vinculada a um lugar,  onde possui nome próprio, tendo sua origem e evolução a partir da terra onde é acessada e da influência sofrida na formação da herança mágico-religiosa e cultural de cada povo, estando assim impregnada na herança cultural e lingüística, com fortes ligações com a história, arqueologia, flora, fauna, clima e geografia do local, de certa forma essa seria a melhor forma de praticar a Bruxaria onde moramos.

Mas é aqui que começa a polêmica[8], pois alguns vêm criando problemas com a forma, objetivos e porque do acesso hoje[9] dessas “Artes Proibidas” pela CASA DOS CORVOS SAGRADOS.

A crítica mais ácida se refere ao motivo de termos NOSSA SENHORA RAINHA DO CÉU[10], SÃO PEDRO[11] e SÃO JORGE[12] e não os Antigos Deuses estrangeiros, mas notoriamente os da Cultura Celta, Grega, Romana, Nórdica e Egípcia, como Patronos.

Nós já havíamos respondido na primeira parte deste ensaio, mas não nos é cansativo novamente tentar clarear a mente dos que desejam sinceramente entender nossas práticas:

1.     O Primeiro motivo é porque somos Antinomianos:

 “...essa forma de viver a nossa fé contradita a moral religiosa dominante e ao mesmo tempo usa dos ícones desta fé dominante como meio de expressão, e sua manifestação é capaz de mudar a realidade nossa e por meio de nós a de outrem...ela realiza atos de benção e maldição...com ela aprendemos a viajar entre os mundos  e comungar com os Espíritos...dela recebemos remédios, e aprendemos mirongas e mandingas com os Mortos desta Terra...e...por meio desta fé e herança mágico-religiosa nós conseguimos voar e mudar a forma, então ela novamente prova por si só ser antinomiana...”

2.     O Segundo Motivo é porque faz parte dos mistérios da Iconoclastia de Nossa Fé:

 “...Ao... usar o ícone da fé dominante transcede-o e ela torna-se no sentido Arcanum do termo uma forma de Iconoclastia, porque ao usar ícones daquilo que ela contradiz, ela não lhe dá o devido valor, veneração e importância contidos no dogma, ou seja, ela quebra-o, reduzindo-a a pó e desta forma mergulha no oceano de Sangue de Todos os Deuses Feridos e mortos...”

3.     O Terceiro Motivo é porque quebra o dogma e moral vigente, portanto é uma heresia[13]:

“...Em termo de expressão da Fé,  isso significa que ela  quebra o limite do dogma da fé dominante representada, pelo, e no ícone, e, no qual ela como Arte Feiticeira  usa e se expressa e ao mesmo tempo esse ato de usar e se expressar naquilo que é contraditório a si para realizar-se, torna-se como já dito, uma ato de amoralidade. Essa amoralidade dar-nos a liberdade, ao tempo que proíbe, que o dogma da fé dominante e os mistérios da fé sem nome seja harmonizado pela moral vigente, pois a Fé sem Nome quando expressa...e usa...o ícone da Fé dominante distorce o sentido e a verdade dogmática que a fé dominante expressa no ícone...ao distorcer o dogma e sua verdade expressa no canôn da fé dominante..a Arte sem nome pratica aquilo que a caracterizou na idade média, ou seja a heresia... .”

4.     O Quarto motivo é porque faz parte de nossa herança e formação mágico-cultural:

“...Está expresso intrinsecamente nesta segunda parte, ou seja, a afirmação consciente  que a melhor forma de acesso a essas artes proibidas  e sua manifestação deve ser por meio daquilo  que a ligada a terra e a herança de cada lugar e povo...e na formação do povo brasileiro, entrou em processo de ebulição no caldeirão de Destino as ervas do índio, as entidades dos negros e a heresia cristã do branco, criando uma religiosidade popular que é impar neste planeta...”

Apenas para que a coisa fique clara e como forma de expressar que a Iconoclastia ou Iconostasys não é uma prática inventada por nós CASA DOS CORVOS SAGRADOS e sim é parte do que se faz em Coventiculos  da Arte Tradicional,  vamos reproduzir uma pequena parte de dois rituais de um dos maiores Magister do Século XX, Andrew D. Chumbley[14],:

“...Os dezesseis Senhores e Senhoras do "Séqüito dos Fiéis Deuses" são vistos como os Guardiões das Cardeais e Sub-Cardeais direções do círculo ou “Área do Sangue”...enquanto a comitiva constitui de direito um panteão por si próprio, ele está em sintonia com os costumes da Nossa Fé Sem Nome e com o Mistério da Iconostasys, onde nossas deidades são freqüentemente sincretizadas com os santos e deidades das chamadas “Crenças mortais do homem”, isto é, com o as veneradas e divinas personagens que presidem as Igrejas de nossas localidades e lugares santos...O Poderoso Pai das Bruxas Mahazhael... Em termos sincréticos...pode ser identificada com Cristo na véspera de Sua Natividade[15]...Liliya-Devala e Mahazhael-Deval são reverenciados na Arte Sabbática como a Rainha e o Rei dos Dezesseis Deuses... Misticamente, eles podem ser venerados como a Mãe Lunar e Pai Solar, os Progenitores das Crianças da Terra, isto é, de cada e todo verdadeiro-jurado Iniciado da Velha Fé. Neste sentido cada macho iniciado é identificado com Caim e cada Fêmea Iniciada é identificada com... a irmã e esposa de Caim; os dois são consideradas os primeiros-nascidos de Liliya e Mahazhael. Em termos do conhecimento do sincretismo da Bruxaria com as formas de veneração do Cristianismo, Liliya-Devala, é identificada com a resplandecente imagem da Virgem Maria, como a Rainha do Mundo. Desta forma, o Manto Azul de Maria, fica sobre o globo terrestre, os seus pés repousam na Serpente Vermelha, demonstrando o Sábio Arcanum Caminho Tortuoso da Espinha do Dragão. Muitas vezes, em tais representações há sete estrelas sobre a cabeça da Virgem; estas podem ser identificadas com as “Sete Luminosas Almas” das Mães do Sábio-Sangue sobre as quais Liliya preside...No desempenho deste rito, diversas imagens da Nossa Senhora podem ser colocadas no Quadrante do Norte e velas são acessas para adoração dela... Juntamente com a figura da Madonna... Ela pode ser identificada também com Madalena, a Secreta Noiva do Crucificado Rei da Luz... Nestes arcanos da Lua Cheia e da Lua Escura, deixe o sábio discernir o caminho que se situa sob a dança mascarada[16]... “

Como, vimos, não estamos praticando uma loucura contra a Bruxaria, talvez nossas práticas, como a do Cultu Sabbatic e outros caminhos Tradicionais do Ofício, choque-se com as práticas do paganismo moderno no Brasil, que teima em reverenciar Antigos Deuses Mortais de culturas estrangeiras que nada ou pouco tenha ver com nosso sangue e ancestralidade....

Eles preferem cultuar uma divindade distante a qual denominada Grande Mãe, aplicando-lhes nomenclatura e forma de veneração de culturas, religiões e povos que não mais existem, apregoam que Bruxaria deve ser um Culto Matrifocal de adoração a essa Grande Deusa, tendo como Dogmas:

...Todas as Deusas São um só Deusa...
...Se Nenhum mal causar, fazes o que tu queres...
....E outros nesta abordagem New Age da Bruxaria...E quem fizer diferente é anátema da Fé...Pena que nada disso corresponde de fato à expressão visível de suas práticas...Fazem isso em detrimento de ligar-se a sua própria hereditariedade e aos poderes e mortos das Terra das Araras...

A final é mais fácil e livre de compromissos reais  com os habitantes pálidos do limiar, ligar-se a Deusas, Deuses e Espíritos de Terras distantes...Pois estes não vão cobrar os juramentos, oferendas e veneração necessária...por meio de chimbas, castigos e maldições....

É muito, mais muito mais fácil, evocar ancestrais míticos de uma  suposta linhagem estrangeira, do que ter que lidar com a Mãe ou Pai que já atravessaram a ponte ou com a visita do avó ou o parente morto que se conhecia muito bem e sabia-se as manias e com os quais não tínhamos ou tínhamos boas relações, que realmente sabem coisas sobre nós e podem falar...aliás quando um parente morto se aproxima de muitos pagãos, não tem Deusa ou Deus estrangeiro certo, correm logo ou para a Casa de uma boa mandingueira ou vão buscar exorcismos da alma e do bolso na rede de segurança de Jesus.

Esperamos ter deixado claro nessa segunda parte deste ensaio, ou explicitado nas entrelinhas, que cada vela acessa, incenso ou cântico, cada prática de magia, evidencia nosso caráter de heresia, antinomia e iconoclastia e o que nos caracteriza como Bruxos Tradicionais Brasileiros.

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O Autor autoriza a reprodução do texto, desde que sejam dados os devidos créditos e direitos (Autoria e link original).




[1]Meu Mestre não é Celta e nem Ibérico, é um Antigo Mestre Encantado, nascido, criado e morto neste solo, então ele não continua mais como parte biológica deste mundo, ele vive em transito entre o aqui e o lá, tendo a velha Deusa Mãe de Todos como meio de ascender e descender entre os mundos, seu portal é a velha e boa Jurema dos Catimbós e Candomblés de Caboclo, sua estrada, a encruzilhada onde reina a antinomia e a heresia.
[2]Para um Lvnae o Adjunto de Jurema, é uma forma de...reencontrar o verdadeiro sentido de comungar com o Povo Pálido,  de cultuar a ancestralidade e de comunhão com os mortos poderosos desta Terra.
[3]Retirado do Grimorium Et Laboret  de Azazel Semjaza Lvnae.
[4]Retirado do Artigo “PRIMAVERA - UMA FESTA DE ASCENSSÃO DE NOSSA SENHORA DA INICIAÇÃO NO ESPELHO DO EGO” que se encontra neste blogger no link
[5]E não uma religião formal com dogmas, moral, roupas, jóias e ritos elaborados.
[6]Ou seja, para que pudessem viajar, por meio dos sacramentos do véu de Lilith, para fora dos limites estabelecidos pela moral e pelo dogma.
[7]Seja, ela Catimbó, Adjunto de Jurema, Quimbanda, Pajelança, Benzeduras, dentre muitas outras expressões locais destas Artes Proibidas.
[8]Pois justamente, alguns Bruxos e muitos pseudos e suposto Bruxos, que ao invés de se preocuparem com suas próprias vidas comuns, com suas práticas e com suas contas para pagar perdem seu tempo a nos enviar e-mails e criarem sites para denegrirem nossa imagem, a velha e batida tática dos anos 90.
[9]Se engana quem acha que o pensamento do mortal homem de barro mudou no tocante a feitiçaria, eles procuram as Artes Renegadas  não para alcançar a Gnosi, em realidade, a maioria quando não tem problemas de ajustes familiares - principalmente jovens e adolescentes -  querem, por debaixo dos panos, apenas sua porção resolutora ou remediadora de mazelas ou o seu poder para dominar o outro.
[10]O poder evocado ou preenchido no ícone vazio pelo nosso Tabú -  Deusa Mãe de Todos (DMT), também denominada Destino, aquele que nos conduz ao outro mundo quando o véu de seu sacramento cai sobre nós.
[11]O poder evocado ou preenchido no ícone vazio pelo nosso Tabú  - Nosso Senhor o Cornudo, aquele que o os tolos chamam o Diabo, portador das chaves que liga o céu e a ter
[12]O poder evocado ou preenchido no ícone vazio pelo nosso Tabú  - Caim (Qayinn), o homem de fogo e Senhor da Forja, o Diabo na Carne
[13]A Heresia e uma das características da Bruxaria Tradicional.
[14]INVOCATION OF OUR LORD OF MIDNIGHT, MAHAZHAEL-DEVAL: BEING A CONJURATION OF THE HIGH SABBATIC WITCH-FATHER:
http://www.pdfdocspace.com/docs/17519/invocation-of-our-lord-of-midnight-mahazhael-deval.html e INVOCATION TO OUR LADY OF MIDNIGHT, LILIYA-DEVALA: BEING A CONJURATION OF THE HIGH SABBATIC WITCH- MOTHER:
http://www.pdfdocspace.com/docs/17521/invocation-to-our-lady-of-midnight-liliya-devala.html
[15]Versão adaptada para o português do Brasil do Artigo de Andrew D. Chumbley Encontrada no Blogger no Link: http://azazelsemjaza.blogspot.com/2010/10/invocacao-de-nosso-senhor-da-meia-noite.html
[16]Versão adaptada para o português do Brasil do Artigo de Andrew D. Chumbley: Encontrada neste blogger no Link: http://azazelsemjaza.blogspot.com/2010/10/invocacao-de-nossa-senhora-da-meia.html

2 comentários:

Anônimo disse...

A veneração brasileira no CCS,torna-o como um a bruxaria que vem de anos de experiência ,como a Ibérica,mas nova com os Deuses nossos .Acho até que na genética ,vai nos levar a memórias ancestrais mais viva,nos conectando mais rapidamente a nossa essência

O Blog disse...

"nos conectando mais rapidamente a nossa essência"
Quer dizer que outras pessoas tem esta conexão de forma lenta??
Não acredito em conexão com os ancestrais partindo de um ponto totalmente diferente dos deles.. é claro, como posso eu nascido no brasil me conectar a alguém da italia? PohHa..! Tanta gente aqui por 'perto'...

Com relação ao texto, gostaria de parabenizar pelas indicações e biografias sólidas e confiaveis.. Basta agora buscar e ver como podemos nos ajudar, uns aos outros..! e digo de outras pessoas que talvez não concordem como que Gael menciona aqui.. Que essas pessoas tenham algo solido de verdade, saindo um pouco do mundo de fadinhas, e possam nos ajudar a como conseguir esta conexão com o divino ou o não-divino.